Estive pesquisando um pouco sobre os aspectos psicológicos quando envelhecemos para um trabalho no mestrado, o resultado segue na integra:
No decorrer da vida a questão essencial é viver bem, o que é largamente aceita pelas pessoas. No entanto, percebe-se maior atenção a essa questão quando as pessoas se dão conta que a vida não dura para sempre. É justamente na fase da velhice que tais questões vêm a tona com maior impacto psicológico nestes sujeitos. Quais as problemáticas dessas questões nesta fase da vida e como isso afeta o dia a dia dos idosos?
Partindo de uma analogia com à letra da música Não Vou Me Adaptar [1], podemos perceber a problemática psicológica que existe sobre a passagem do tempo e suas implicações na subjetividade humana.
| |
Não Vou Me Adaptar Titãs Composição: Arnaldo Antunes | |
“Eu não caibo mais | Retrata a passagem da fase infantil em direção à vida adulta. O adolescente se sente abandonado pelo adulto (seus pais) e essa é a crise adolescente. |
“Será que eu falei | Não entende e não se faz entender naquilo que ele queria dizer. |
“Eu não tenho mais |
Duas implicações psicológicas aqui: |
“Será que eu falei | |
“Não vou! | A resistência humana em aceitar a morte. Que basta nascer para começar a caminhada ao fim. |
Em seu trabalho, Mello [2] aborda os aspectos psicológicos do envelhecimento e suas relações com alguns fatores históricos da velhice na modernidade:
“Desaparecimento do princípio unificador do universo: A desmontagem do mundo medieval culminou em um desencantamento do mundo.” Tudo era explicado por preceitos concebidos pela religião e suas verdades inqüestionáveis.
“Tempo de rupturas - Teocentrismo /Antropocentrismo – Laicização.”
“Idade Média - Conhecer os deuses para alcançar o céu.”
“Séc. XVI - Começa a criar a possibilidade de construir um mundo mais confortável - Razão Instrumental Exata – Ciência” As afirmações de Galileu Galilei desencadeiam novas percepções para a ciência.
“Projeto moderno: Conhecer a natureza para colocá-la a seu serviço.”
Esses fatores históricos nos custaram um preço perceptível hoje tais como [2] a desvalorização da autoridade do passado, a quebra de tradição. Envelhecer tornou-se inconcebível, pois o desejo de transformar o homem em imortal, belo e poderoso agora torna-se um projeto fracassado. Além disso, houve a “extinção” do espaço público, priorizando o espaço do privado, ênfase ao individualismo e da morte do paraíso terrestre.
Como conseqüências da modernidade segundo Mello [2] temos:
Império do Efêmero
Consumismo: Ênfase no ter e não no ser
Busca frenética pelo prazer: Hedonismo
Individualismo: Emergência do Narcisismo
Culto ao corpo: Mito da “eterna juventude”
Sobrepujança do novo
Sociedade dos descartáveis: “peças”
Medo da morte / velhice
Perversidade
Segundo Mello, outros fatores como a perda do sentido da continuidade histórica: Guerra à tradição; a banalização do sexo e da violência; a submissão ao império da tecnologia; a valorização da memória informativa e desvalorização da memória evocativa; a espolitização.
Temos ainda em uma sociedade industrial capitalista, a produção e o consumo são os divisores de águas para legitimar os espaços sociais que a pessoa ocupa; a necessidade de valorização, de ser admirado pela beleza, pela celebridade e pelo poder, tornam o envelhecimento intolerável; imperativo da juventude; era do vazio: busca individual pelo sentido da existência.
Todos esses fatores são conseqüências da modernidade frente a sociedade, impactando o psicológico das pessoas, sentido principalmente na fase da velhice. Destacam-se aqui os problemas da desvalorização da memória evocativa, o culto ao corpo e a busca pelo poder. Para as pessoas que envelhecem diante de uma sociedade moderna tal como essa, torna-se difícil lidar com essa problemática.
A memória evocativa para os idosos por exemplo, têm apego maior para esses indivíduos por terem vasta experiências de vida. Existe o desejo de compartilhar tais experiências com os outros, pois isso é uma tentativa de se sentirem valorizados por seus atos passados ou presentes, mas são poucas as pessoas que gostam de escutar histórias de idosos. Normalmente são os netos e seus colegas de uma mesma faixa etária que compartilham dessas experiências. Falta paciência dizem alguns.
O culto a beleza ao corpo é aceita na sociedade moderna, mas é na fase da velhice que percebemos as principais mudanças no corpo, e as menos lembradas, rugas, cansaço, cabelos brancos, perda de massa muscular, entre outros problemas físicos. Isso indica para o sujeito que o fim está próximo e o seu corpo está dando o sinal de alerta, manifestando-se em mudanças biológicas e físicas, limitações e doenças estão mais presentes nesta fase. A imagem imposta pela mídia e a cultura da sociedade moderna entra em conflito com os resultados e desejos de continuar a viver, mas continuar a ser bonito, forte como era no passado.
Outro aspecto importante é a busca por poder. Para os idosos que tem dinheiro costuma-se aceitá-los na sociedade por sua influência de poder. Mas se não tiver dinheiro, há bastante preconceitos entre seus semelhantes e a sociedade. Há de se considerar que mesmo aqueles que tem bens e posses, conseqüentemente poder, não ficam excluídos de problemas psicológicos, pois se sentem infelizes diante da questão da morte e aspectos pessoas de suas histórias e expectativas.
Mello apota três saídas [2] que hoje são percorridos nas tentativa de enfrentar as problemáticas psicológicas do envelhecimento:
“Aquele que tem muito tempo de existência, gasto pelo uso, desusado”. Objeto da piedade e compaixão. Pólo oposto da exacerbação do culto ao eu, legado máximo dos tempos modernos.
“A Modernidade justifica as práticas capitalistas e afirmam a individualidade saudável”. Consumidor ávido das ilusões da modernidade.
“Posição crítica frente ao consumismo selvagem.” O sujeito não é submisso aos códigos da modernidade, nem tampouco é um consumidor de ilusões. O sujeito é construtor de sua própria “OBRA” - Vida autêntica.
Um ser que envelhece (Envelhe Ser)
Para entender melhor os aspectos psicológicos envolvidos podemos tentar entender o que é envelhecer. Alguns aspectos comuns [2] [3] sobre esse entendimento dizem despeito: a capacidade de dar sentido à existência; resignificação das perdas normais e patológicas; conjunto de significados construídos ao longo da existência.
Geralmente o processo de interiorização do envelhecimento é visto como algo negativo. Estas imagens, a princípio distantes da realidade, passam a ser auto-imagens negativas quando se envelhece. Distância abismal entre o desejo e a representação.
Para Mello [2] O envelhecimento é a própria existência se constituindo. Vamos sendo enquanto envelhecemos, vamos ENVELHE-SENDO e na medida em que somos, envelhecemos. Citado um comentário anonimo: “Mesmo a extrema falta de liberdade física e mesmo o desespero existencial não logram privar o homem da liberdade de decidir, além e acima do presente, o que ele virá a ser no futuro” Abordar a experiência existencial do envelhecer é resgatar, na pessoa do velho, o homem na sua totalidade. E identificar-se com ele.
O grande impacto psicológico que percebemos é aceitar a morte e a descontinuação da vida. Isso não é aceito naturalmente e por essa razão temos diferentes problemáticas vivenciadas, principalmente nas fase do envelhecimento, cujo conflitos se agregam diante de uma sociedade moderna que vê o idoso como “algo descartável”.
[1 ] A. Antunes, “NÃO VOU ME ADAPTAR letra (Titãs) ♫”; http://letras.terra.com.br/titas/48986/.
[2 ] M.D. Mello, “Aspectos Psicológicos do Envelhecimento”; http://www.ciape.org.br/matdidatico/mariademello/psicolog_env.ppt.
[3 ] A. OLIVEIRA, “Aspectos psicológicos do envelhecimento,” Universidade Federal de Uberlândia (UFU), 2002.